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quarta-feira, 9 de março de 2011

Esperanças

Esperanças
Crônicas do Ponto de Ônibus
Pedro Penido


No ponto de ônibus as pessoas aguardam não apenas o coletivo. Elas esperam muito mais. Esperam que a viagem seja rápida, que o ônibus não esteja muito cheio, que um flerte esteja presente, que haja uma cadeira seca, que as janelas estejam fechadas (ou abertas!), que não haja viajantes ouvindo jogo ou música em alto volume, que a roleta não trave (e envergonhe!), que o trocador seja gente boa (ou que seja apenas eficiente), que o motorista pare na marca certa do ponto, que a chuva pare antes do ônibus chegar (ou que pare na hora de descer), que o percurso não seja um campo minado, que o livro esteja na mochila, que a mochila não seja alvo de furto, que o responsável pelo furto não esteja armado, que a arma não dispare e, se disparar, não acerte o motorista, e ninguém mais.

No ponto de ônibus espera-se muito mais que apenas o coletivo. As pessoas costumam esperar que, feito mágica, seus problemas sumam até a viagem se completar, esperam um jantar quente e saboroso na mesa, esperam seus parceiros quentes e saborosos na cama, esperam a lua fria e brilhante nas ruas ermas no caminho de casa.

No ponto de ônibus as pessoas sempre esperam. Mas não apenas pelo coletivo (que pode demorar a chegar). Esperam por alguém que passe e lhes ofereça carona até em casa ou até o futuro afora. Esperam bons ventos. Esperam que amigos e parentes superem as dificuldades e, enquanto pensam nisso, esperam que estes mesmos parentes e amigos não se envolvam em enrascadas. Esperam enquanto fumam, enquanto devoram um livro ou a propaganda de alguma loja. Esperam enquanto buscam olhares que se compadeçam dos seus. Esperam... pois só lhes resta esperar.

No ponto de ônibus as pessoas são de todos os lugares, credos e perspectivas. Mas encontram mínimo denominador comum na árdua tragédia da espera. E esperam, atônitas (ou ansiosas), catatônicas (ou angustiadas), o coletivo chegar. E, no mar dos seus, todos são ímpares, todos aguardam, esperam, imersos em reflexões sobre o dia vencido, o dia em guerra e o dia vindouro.

No ônibus as pessoas viajam e esperam... esperam enquanto cochilam largadas nos bancos, enquanto cochilam de pé perdidas entre os demais. Esperam e esperam... Num desconfiado ato de fé, disfarçado de modus vivendi, esperam o mundo mudar. Pois sabem que para que isso finalmente aconteça não se pode mais esperar!

3 comentários:

  1. Verso Fractal
    Não só um jarro de pensamentos...
    Mas uma Pira flamejante de pensamentos que não ousam se mostrar em outro lugar

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  2. Um dos segredos da vida é não planejar roteiros.

    Também, nem adianta planejar, a vida, essa louca desvairada, sempre vem atropelando tudo pela frente...

    E daí nossos planos sempre são modificados a cada ponto de ônibus.


    Adoro suas reflexões.
    Beijos e abraços

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